Com a queda de temperatura, por causa da chuva, me ocorreu a lembrança desta poesia de Gióia Jr.
ORAÇÃO
PELOS QUE VÃO MORRER DE FRIO
GIÓIA
JUNIOR
Os
que vão morrer de frio,
Os
velhos, as mulheres e as crianças,
que
perambulam pelas cidades como cães –
dos
baixos dos viadutos nos comtemplam.
Há
nos seus olhos como que escamas
de
lágrimas permanentes
e
geladas
Os
nossos reluzentes carros –
couro
e metal, borracha e música
aceleração
e indiferença –
os
nossos bem-amados carros
passam,
e
do fundo do poço eles nos olham –
e
seus olhos são mãos de náufragos estendidas
que
a nossa mão nem procura nem alcança
Os
que vão morrer de frio
fazem
uma imensa, estranha fila
como
aquele cortejo sinistro em coluna por um
campo
de concentração
na
ante-sala da câmara de gás
na
antecâmara do forno crematório.
A
caminho da câmara refrigeradora
eles,
nus e mortos,
sem
idade, sem nome, sem cic
nos
acenam com os olhos...
Em
nossa casa há cobertores térmicos
e
mantas elétricas
e
aquecimento central
e
lareira e egoísmo.
Os
que vão morrer de frio
cantam
uma ladainha
mas,
os pregões da Bolsa e a algazarra dos jatos
tornam
para nós o seu canto inaudível.
Não
os ouviremos,
Não
os veremos
E
ainda assim conseguiremos dormir em aparente paz.
Deus
tenha piedade de nós
5-7-75